quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Liberdade de expressão e militarismo.

Numa reunião informal com alguns blogueiros baianos e Alexandre Inagaki, este último me pergutou: “vocês são proibidos de falar alguma coisa no blog?”. Sim, respondi. A disciplina peculiar às instituições militares – seja nas forças armadas ou nas polícias militares – limita a manifestação de seus servidores em alguns aspectos, uns explicitamente definidos em lei, outros já culturalmente arraigados nos costumes da caserna. Exemplo de norma que limita o teor da manifestação dos militares está no Código Penal Militar, quando diz, em seu artigo 166:

Art. 166. Publicar o militar ou assemelhado, sem licença, ato ou documento oficial, ou criticar publicamente ato de seu superior ou assunto atinente à disciplina militar, ou a qualquer resolução do Governo:

Pena – detenção, de dois meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.

Apesar da categórica proibição, o próprio Código flexibiliza a conduta, quando trata do crime de Ofensa às Forças Armadas (art.219 do CPM), e exclui a pena para “a apreciação crítica às instituições militares, salvo quando inequívoca a intenção de ofender”, e para quando se tratar da “opinião desfavorável da crítica literária, artística ou científica” (incisos II e III do Art. 220, respectivamente). Administrativamente, há outras limitações, que se adequam às determinações do comando de cada força, a exemplo do que determinou, em janeiro deste ano, o comando da Polícia Militar de Minas Gerais:

“Fica proibida a utilização de imagens institucionais, de viaturas, de militares fardados ou que conduzam ao entendimento de que seja de integrante da Polícia Militar, em sites de relacionamentos ou similares, páginas pessoais ou empresariais, blogs ou qualquer outro meio de divulgação desenvolvido na Internet”

Culturalmente, a manifestação de idéias e opiniões por parte dos militares fica resumida na frase dita certa vez por um oficial da APM-BA: “o militar tem a permissão para dizer o que quiser, mas na posição de sentido”.
Comunidade PMBA no orkut: como controlar?

Quando se questiona essas limitações ao policial, a crítica vai diretamente ao caráter de espargidor de cidadania que todo policial deve possuir em sua atuação. Se, por um lado, o policial não é pleno no exercício dos direitos comuns aos demais cidadãos, poderá ele ser um distribuidor de cidadania? Se cotidianamente o policial encontra problemas de complexidade tal que uma visão maniqueísta não é suficiente para solucioná-los, e, por conseguinte, deve desenvolver grande capacidade de flexibilização, entendimento e convencimento, por que ele não pode usar esses atributos para promover discussões sobre a realidade em que está inserido, modificando-a, desde que de maneira respeitosa, como em qualquer outra profissão se faz?

Na atual realidade, onde a internet ampliou de modo assustador as possibilidades de expressão das pessoas, é praticamente impossível limitar a difusão de opiniões ou idéias de qualquer grupo social. Antes, cabe às organizações militares conscientizar e discutir internamente com todos os seus participantes as conseqüências que pode gerar, por exemplo, um simples scrap no orkut ou uma palavra dita em uma entrevista para um jornalista. A sugestão para os militares que entendem que o fomento de discussões e a produção socializada de conhecimento são necessárias para o desenvolvimento da profissão que, antes de mais nada, tem caráter eminentemente social, é a utilização do bom senso ao publicar qualquer conteúdo. Aqui no Abordagem nunca tivemos problemas de ordem disciplinar relacionados ao teor dos posts no blog, ao contrário, comumente recebemos elogios dos superiores hierárquicos que nos leêm.

Se por um lado as polícias devem promover a liberdade de expressão para os seus participantes, com a natural limitação existente para que não cometam calúnias, injúrias ou difamações, é preciso que os policiais imponham-se através da responsabilidade nos seus discursos falados e escritos, da não utilização da verborragia incendiária (que talvez seja conseqüência das limitações existentes) e da maturidade no teor das palavras. Muitas vezes, o problema não está em dizer, mas no modo que se diz, e é atentando a isso que a maioria dos blogs policiais, por exemplo, estão conseguindo se impor como formadores de opinião.

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